terça-feira, 30 de novembro de 2010

Sorriso na voz.

São 23h30. Falta meia-hora para me pôr a andar. Estão cá 8 assistentes. Um deles está ocupado. Os outros estão a ler, a conversar ou a escrever em blogues, como eu. Bem-vindos ao meu call-center. Se tivesse no horário da tarde: 1) não teria este tempo de ociosidade e 2) o boss não perdoaria este meu escape.

Por falar em boss...é mesmo dele que quero falar. O típico boss-gay, mete-nojo, frustrado-inconformandis, agressor psicológico e intimador. De vez em quando, observo-o ao longe...como se fosse oriundo de uma estirpe que mistura infantários com discotecas. A voz dele identifica-se ao longe...ele tem uma espécie de sorriso na voz, mas é um sorriso maléfico e jocoso, como o do Joker. É uma voz homossexual, definitivamente. Daquelas "não me toques que me desafinas". Tal e qual.

Esta criatura, tecnicamente apelidada de boss-gay, tem o nariz torto, bate o pé, maltrata os assistentes e chama nomes aos supervisores. Geralmente, os supervisores são os intermediários entre os assistentes e o boss (o coordenador), ou seja, os comunicadores raramente falam directamente com o boss, a não ser que este queira insultá-los. Como vêem, neste serviço, a distância entre os superiores e a base da pirâmide é tão ínfima como numa instituição sueca.

O boss é tipicamente capaz de não perceber ponta deste serviço. Só sabe dizer que somos "chatos". Todos nós. Ele grita e chora, olha para nós como se fôssemos aquela gentinha, tipo escumalha. Tenho várias provas de que ele realmente pensa assim, com toda esta arrogância e pseudo-superioridade:

- O boss já negou férias aos supervisores durante dois anos consecutivos;

- Já despediu colegas minhas que não se arranjavam tanto e que eram capaz de cheirar mal...(ok, isso ninguém quer no ambiente de trabalho, não pude foi deixar de ficar com a ideia de que aquelas colegas estavam a arruinar o "castelo" do monstro e que, por isso, foram despedidas);

- Nunca está cá nos feriados para dar o exemplo aos que estão cá os 360 dias por ano;

- Ataca (como uma fera) os novatos que (julga ele) têm potencialidade para uma conversão sexual ou um salto até à espinha; sai do seu trono ao canto da sala e ronda, literalmente, as secretárias onde lhe cheira a rabinho novo, como um cão que fareja uma árvore durante 3 horas. Incontáveis as vezes em que ele ficou a fazer "horas-extra" à espera que alguns dos novos-colegas saíssem para jantar.

...Cuidado, que ele cola-se com muita facilidade.

Fico por aqui. A campaínha já está quase a tocar. E eu estou com as orelhas a arder.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O turno da noite.

Uma das poucas vantagems que os call-centers oferecem aos seus funcionários é a flexibilidade de horários. A maioria dos centros de assistência permite escolher as folgas. Quando comecei, pedi a sexta e o sábado mas claro que isso era impossível, então folgava à quinta e ao sábado (verdade seja dita, o boss não suporta que os assistentes peçam dois dias seguidos, especialmente aqueles de quinta a domingo).

Passado um anito, lá me deram o fim-de-semana, sem eu ter de pedir. Era conveniente à empresa, o domingo é sempre o dia menos agitado e as fornadas de novatos estão sempre a entrar e a sair, por isso mais vale perder um assistente ao domingo do que não ter um à quinta-feira. Tive de pensar. Já estava habituada a ter folgas intercaladas e a minha vida já estava toda organizada de acordo com elas... mas bom...folgar dois dias seguidos é sempre diferente. Nem eu, na altura, me apercebia que só se descansa bem e em condições com um sábado e um domingo pelo meio, seguidos.

Mas o que eu queria mesmo falar era do turno da noite. Voltando à conversa inicial, a flexiilidade de horários também possibilita a escolha da carga horária, que varia entre as 4, 6 e 8 horas. Eu cá estou 6 horinhas por dia (e já é muito!), das 17h até à meia-noite; mesmo assim, as 6 horas viram 7, a contar com a hora de refeição pelo meio. Admiro as almas vivas que aguentam 8 horas por dia desta pomada, devem ser pessoas que nasceram para isto que adoram atender telefones.

Inicialmente, escolhi o horário da noite porque tinha afazeres da parte do dia. À medida que esses afazeres vão-se apagando da minha agenda, começo a ponderar uma subida da escala, p'ra ver se ainda chego a casa a um horário decente, tipo 23h ou 00h, em vez de chegar perto da uma da manhã. Depois começo a pensar nos benefícios do turno da noite: bónus nocturno de maizomenos 20 euros por mês, apanhar o boss apenas duas horas até ele bazar lá para as 19h (ninguém o suporta). É...realmente, o turno da noite tem as suas vantagens, menos telefonemas, menor controlo do patronato, uma turminha jeitosa que cá fica até à meia noite, o não ter horas de ponta a ir e a sair do trabalho...E bom, já estou tão habituada a esta vida de morcego que talvez me desse mal noutra.

E foi assim que os fins-de-semana regressaram à minha vida. São estas as pequenas conquistas que nos dão gozo. Tenho saudades dos tempos que nunca tive, daqueles tempos em que uma pessoa trabalhadora fazia o horário de escritório, 9 to 5 e ao final do dia regressava para o seu ninho. Por agora, tenho os fins-de-semana. E de mim ninguém os tira.

domingo, 28 de novembro de 2010

Confissões de uma assistente.

Estou doente. E tive de vir trabalhar. Sabem quando não têm cabeça para nada e basta ouvir um mínimo decibel para ficar com uma enxaqueca? Pois...

Há dias em que não queremos falar com ninguém. Este é um desses dias, um dia completamente arruinado por um trabalho que nos obriga a brotar, constantemente, sons da boca.

Hoje, o dia perfeito para mim, seria estar aqui no escritório como entrei: no meu mundinho. Os únicos phones que teria na cabeça seriam os do mp3 player e a única voz que ouviria seria a da Shirley Manson, dos "Garbage". Isso é que era.

Agora, estar aqui sem conseguir balbuciar algo em condições, fazer um esforço para sair apenas um grunhido sonolento...não. Isso é que não. Especialmente por causa daqueles clientes, que vêm todos lampeiros à espera de conversa fiada. Sofro por eles, que em dias como este, não têm qualquer hipótese. Qualquer tentativa que eles tenham de alongar a chamada vai resultar, inevitavelmente, num corte brusco e, se for preciso, rude. É a vida. O S.O.S Amigo é noutra linha.

sábado, 27 de novembro de 2010

Colegas...

Céus. Agora eu percebo o quão irritante é ligar para uma linha de apoio e ouvir, do outro lado, um(a) assistente sem ponta de profissionalismo. Quem é que vai adivinhar que um assistente de call-center vai ligar para outro call-center, certo? Mas nós também temos vida própria! Só quando nos sobra um pouco de tempo para organizarmos as nossas vida e precisamos de algum tipo de ajuda proveniente de call-centers, é que percebemos as falhas cruciais de comunicação nas maiores linhas de apoio ao cliente.

Desta vez a assistente falou comigo como se tivéssemos no café. Nem me perguntou o nome nem me disse o dela. Na voz não havia sorriso, havia talvez uma ressaca de todo o tamanho. Nunca saberemos. Se houver justiça neste mundo, os supervisores ouvirão a chamada em questão e a menina super rude irá levar nas orelhas. Eu, uma assistente espectacular, aturar pobrezas de comunicadores? Não me parece.

Sou grata e agradeço estas experiências que, ao menos, permitem-me não me esquecer dos princípios básicos de etiqueta ao telefone. Quanto mais tempo passar, enquanto estiver neste call-center, cada vez menos vontade tenho de contactar outros call-centers.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Más línguas.

As más línguas rondam neste escritório. A começar pelas diferenças culturais que nós, assistentes, temos de derrubar.

Todos os clientes internacionais que atendemos, correspondem a uma imagem formada, a um protótipo. Até porque o som é imagem. Assim, quando falamos com ingleses, já sabemos que eles são os clientes mais simpáticos e bem-educados. São dos poucos capazes de agradecer a simpatia e a elogiar o nosso trabalho. Imaginamos logo um cliente todo aprumado a beber o seu chá enquanto fala connosco. Sério. É revigorante. Especialmente depois de falarmos com os americanos que, além de nos tratarem como atrasados mentais, gritam connosco a toda a hora coisas do género "YOU RUINED MY CHRISTMAS!". Os americanos fazem-nos sentir mal. Mesmo. Apesar de~nem serem dos piores.

Os espanhóis que apanhamos são engraçados. É diferente, pois eu não tenho "skills" para atender em espanhol, no entanto, volta e meia cá eles cantam ao ouvido, o que me força a puxar pelo "espanholês". Lá me desenrasco com um "buenas tardes" e "gracias por aguardar". Não gosto muito destas misturas (explosivas). Já aconteceu a comunicação não se conseguir fazer ao ponto de eles desistirem e me desligarem o telefone na cara. Ainda bem que isso, por vezes, acontece. Se há coisa mais irritante do que um açoriano ou madeirense em linha (e os seus sotaques alienígenas aniquiladores da beldade da língua portuguesa), é aquela sonoridade espanhola, sempre igual. Parece que falamos constantemente com a mesma pessoa e parece que ela está sempre zangada.

Há quem diga que "a incompreensão é a maior solidão". Sinto profundamente essa constatação quando lido com os BRASILEIROS, que constituem 50% da nossa clientela. O Brasil e Portugal são países separados pela língua portuguesa. Sem dúvida. Como há mais afinidade linguística, há menos tolerância, pois os brasileiros, regra geral são burros. Burros que nem uma porta. Têm uma extrema dificuldade em perceber a mais básica das palavras com pronúncia portuguesa. Vou ilustrar a situação com um exemplo dialógico:

- (nome do serviço), boa tarde, está a falar com "Paulo", em que posso ajudar?
- Hããã...Oi...!?
- (nome do serviço), boa tarde, está a falar com "Paulo", em que posso ajudar?
- Eeehhhh...quem?
- Paulo!
- Ah, Fernando! Tudo bem? 

E mesmo assim, eles percebem mal os nossos nomes, se for preciso. Ou seja, 5 minutos só para a saudação e troca de identidades. 5 minutos é o tempo em que "despacho" um cliente inteligente, que saiba o que quer e que perceba bem o português, à primeira. Geralmente, com o brasileiros, temos de repetir mil vezes as deixas e até chegamos ao ponto de nos ter de rebaixar e falar com sotaque brasileiro. Esta do sotaque foi a descoberta mais recente, antes começava a falar em câmara lenta e com a máxima gesticulação bocal, até parecer uma anormal. Como isso não adiantava, então comecei a falar brasileiro. Ué, melhorou muito, viu?

Outra consequência de lidar com muitos brazukas é a importação de algum vocabulário "zuka". Quando dou conta, já estou falando no gerúndio e utilizando expressões como "por gentileza...". A dislexia também é contagiosa. Se a gente fala "PT", eles vão certamente dizer "TP", por isso, alguma psicologia inversa vai ser o próximo método experimental.

Contudo, por vezes ainda dá para rir com os "zukis". Alguns são simpáticos e a maior comédia. Outros são, simplesmente, burros e chatos. Há de tudo. O culminar da situação "zuki" consiste em clientes que, mal ouvem o português, desligam a chamada por aversão (sim, a gente sabe de que país nos estão a ligar); outros, respondem "Eh..." e "Isto!" (em vez de dizerem "isso", eles dizem "isto") a todas as perguntas que a gente faça, com medo; há também os que preferem falar connosco em inglês, pois percebem melhor o inglês do que "o português de portugal".

A cereja em cima do bolo são os brasileiros imigrantes. Misturam todas as línguas e sotaques. É o terror.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Conhecer o inimigo.

Saber os segredos e os podres de cada emprego dá um gozo tremendo. Não vou desenterrar muito o assunto, mas fiquem sabendo que, no que respeita a centros de assistência, nem tudo o que ouvem é verdade. É melhor focarem-se naquilo que "não" ouvem, quando ligam para um call-center. É atrás de cada pequeno silêncio que, por vezes, se escondem grandes verdades...

Duas palavras-chave para este post: mute (capacidade de impedir que o cliente ouça qualquer coisa do lado de lá, através de um botão) e TMA (tempo médio de atendimento). Estes conceitos estão muito interligados e andam de mão dada. Geralmente o TMA ideal fica entre os 6 e os 7 minutos. Ter um TMA grande ou pequeno demais é sempre um problema. Para os mais despachados, o problema recorrente é terem um TMA menor que 6 minutos, o que levam os assistentes a repensarem muito as suas "estratégias de comunicação".

Todos os truques são válidos para prolongar a chamada por mais 3 minutos. Logo, enquanto um assistente vos pede para aguardar e vos coloca em espera a ouvir música clássica, não se admirem se:
- ele foi dar uma escapadinha rápida ao WC;
- foi beber aquele iogurte e roer uma bolachinha;
- foi comer, secretamente, metade de uma pastilha elástica, ou então metê-la no lixo e sacar de um Halls;
- foi trocar uma palavrinha com o colega ou o supervisor ao lado.

Por outro lado, sempre que pensarem que podem, sem mais nem menos, insultar um assistente ou descarregar nele todas as frustrações de uma vida, párem para reflectir, porque ele pode:
- carregar no botão mute e insultar-vos, sem vocês ouvirem;
- carregar no botão mute, insultar-vos e baixar o volume da chamada para não ter de ouvir algumas barbaridades desnecessárias; o assistente deixará que o cliente fale tudo, para depois responder, com a máxima ética e simpatia, que "as reclamações são sempre bem-vindas para aperfeiçoar o serviço".

Não pensem que isto acaba aqui. Há muitos clientes que, pelo historial, perfil e feitio, ficam marcados na "lista negra" de qualquer call-center. Não que a gente vá recusar o nosso serviço ou ser mal-educados. Esta observação é só para que fique bem claro que os comunicadores já conhecem alguns clientes, mesmo sem falarem com eles. Os maus ganham má fama e a simbiose profissional obriga-nos a preparar-nos uns aos outros para muita da escumalha que nos aparece, de modo a que temos de reforçar as nossas defesas naturais para um certo tipo de gente. Enfim, conhecer o inimigo.

Como vêem, ninguém se esconde atrás de um telefone. Porém, todos escondemos alguma coisa, atrás de um telefone.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Ligados às máquinas.

Claro que, apesar dos tempos de "época alta", o que significa atender muitas chamadas em grandes períodos de tempo sem parar, também existem os períodos "mortos", em que temos de trazer um livro para passar as horas. Esses períodos costumam coincidir no Natal e na época do Verão, embora não seja regra geral, uma vez que num call-center o imprevisível está na ordem do dia. Como somos uma linha que trabalha todos os dias, das 8h da manhã até à meia-noite, incluindo fins-de-semana e feriados, e lidando com clientes a nível internacional, é de esperar que durante a maioria dos feriados nos "caiam" telefonemas da outra parte do mundo.

Voltando aos tempos mortos...é lixado estar ligado às máquinas só como nós estamos. São muitas próteses tecnológicas juntas (os headsets - aka bandoletes - ficarão para outra altura), aliadas a um controlo estrito que contabiliza tudo, desde as pausas até aos atrasos. Não queiram fazer mais um minuto de pausa do que aquele que é estipulado. Não queiram chegar um minuto atrasados: isso vai reflectir-se nos vencimentos.

O que queria mesmo falar é do paradoxo de estarmos ligados às máquinas, quando nos tempos mortos estamos estritamente proibidos de navegar na internet ou, aplicando o correcto termo técnico, de "consultar páginas fora de âmbito". Podemos passar uma hora a olhar para o ar, ai de quem tente abrir o Gmail. Por outro lado, os livros e as revistas são sempre bem-vindas. Isso já não traz problema algum, independentemente de ser mais indecoroso estar no escritório a ler uma revista do que a ver, discretamente, uma página na internet. Mas regra são regras. Nada a fazer.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Elas, as mazelas.

Não é para menos. A vida num call-center provoca graves mazelas físicas e psicológicas. Além de não termos tempo para ir ao WC, além do nosso salário ser contado ao minuto num controlo muito rígido, tipo um "picar o ponto" de terceira geração, não temos quase tempo para comer. As chamadas nunca páram de cair. E caem a uma velocidade estonteante, enervante, mesmo. Somos obrigados a acelerar o ritmo natural das coisas, o que é mau, pois não somos máquinas. Só para dar um exemplo: quando comecei a trabalhar aqui, estava com a ideia de deixar de fumar... mas em breve o vício atacou, mais forte do que nunca. (Não gosto de colocar culpas alheias...mas) acho que foi culpa do call-center. Se tenho problemas e conflitos interiores a nível de stress e ansiedade, é por causa do call-center. Esqueçam o yoga e a meditação...não funciona. Começamos a atrofiar com a lentidão do processo, com as respirações, começamos a tremer porque o corpo não consegue acompanhar a velocidade da cabeça, como num espasmo constante.

Sou daquelas pessoas que nunca paráva de falar, até vir para um call-center. Desde que a minha voz se tornou o meu instrumento de trabalho, que deixei de ter garganta para muita coisa. Antes gostava de rir alto, de cantar, de falar...tudo isso se perdeu naqueles dias de amigdalite afónica em que fui obrigada a trabalhar, porque não podia faltar ao serviço. Os assistentes de call-center têm que ter tanto cuidado com a voz como os radialistas. Se ficam doentes da garganta, perdem o seu instrumento de trabalho. Por sua vez, o próprio trabalho impede que um assistente de call-center se recomponha de qualquer resfriado ou constipação. Se estamos afónicos, é certo que vamos piorar depois de um dia inteiro ao telefone a falar, como se 1+1 fosse igual a dois.

São estas algumas das consequência de trabalhar num call-center. Ganhamos calo mas também perdemos qualidade de vida.

domingo, 21 de novembro de 2010

Manter "a linha".

Ok, é bonito admitir os erros e as falhas inerentes a este tipo de serviços. Nem sempre a comunicação é linear ou facilmente conseguida. Os clientes tratam-nos mal porque eles também são primeiros a levar por tabela as consequências de uma linha imperfeita. Quantas vezes, em épocas de grande fluxo de chamadas, os clientes ficam meia hora à espera que os atendam? Quantas vezes, depois dessa meia hora à espera, os assistentes ainda os transferem para outro sector? Pfffff...isso é só o maior sinal de incompetência e inutilidade de um serviço. Enquanto cliente, eu passava-me quando este "ping-pong" acontecia. Desde que trabalho num call-center que sei ser mais compreensiva com os meus "colegas" de trabalho. Quando ligo para aquelas linhas de apoio mais básicas, já sei a lenga-lenga toda e poupo tempo aos comunicadores, nem os deixo fazer a saudação, entro logo a abrir, apresento-me e exponho o problema. Não sou daquelas que nem sabe bem o que quer e que anda p'ráli a dar voltas e a engonhar no assunto. Se os clientes pudessem ver o ambiente dos call-centers, se eles ao menos pudessem imaginar as salas, as pessoas, as dinâmicas, os ritmos...tenho a certeza que iriam-nos poupar muito sofrimento. Há criaturas que têm um prazer especial em descarregar em cima dos assistentes muita frustração, muito chorinho e muita solidão. É como eu digo, falamos com pessoas de todo o lado e é impossível que um maluco ou outro não nos caia na rede, de vez em quando.

Como assistente, sou bastante incisiva. Tento evitar fazer as coisas que não gosto que me façam a mim, como a questão do "ping-pong". Às vezes até vou mais além, quero tanto ajudar que mesmo que o assunto esteja fora de âmbito, eu lá dou um jeitinho, isto se a coisa for de fácil resolução. Mas tenho dias. Longe já vão os primeiros tempos de adaptação em que aconteceu responder torto (alguns mereceram!). O engraçado é que há todo um género de assistentes, desde os calminhos de sorriso constante na voz (que eu admiro profundamente), até aos mais brutos e deprimidos. Há uns mais conformados do que outros. Admito que já estive para morrer em linha, da mesma maneira que já apanhei um assistente que parecia que estava a desfalecer em linha, ou a acordar de um sono muito profundo. O lado filosófico da questão reside em apercebermo-nos como uma linha telefónica, destinada a um serviço, pode servir para tantas outras funções distintas: confessionário, saco de pancada, livro de reclamações e almofadinha-que-abafa-o-choro. E isto serve tanto para o cliente como para o assistente. É uma reciprocidade muito bonita.

sábado, 20 de novembro de 2010

Vergonha na cara.

A proliferação de call-centers deve ser um dos fenómenos mais interessantes dos últimos tempos. Para qualquer serviço, existe um centro de assistência. É indispensável e inevitável. A questão é que o centro de assistência é só a ponta do iceberg que "vemos" desse serviço. E é por isso que nem sempre é fácil trabalhar num call-center. Lidamos com clientes zangados, burros e maus. São inúteis as tentativas de desligar a chamada e vãs as esperanças de que alguns clientes deixem de ser como são. Então perdemos a cabeça e até nos acomodarmos, muita é a revolta e o suor. Porque o trabalho num call-center é um teste, um teste de paciência, sobretudo. É como um desporto radical intelectual, onde se testam os limites da tolerância humana. Há quem nos critique porque nos "escondemos" atrás dos telefones. Por mais falta que sinta do contacto visual humano, por vezes agradeço aos céus que assim o seja. Nem todos temos perfil para lidar com certas criaturas que nos aparecem "à frente", desde as mais execráveis às mais patéticas e ridículas. Por isso sim, escondemo-nos atrás dos telefones q.b., pois também sabemos que é ao telefone que muita gente tira a máscara e se revela. Há quem não tenha vergonha na cara...mas isso já é outra conversa.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Mais vale ser telefonista do que desempregado.

Trabalhar num call-center é um trabalho tão honroso como outro qualquer. Têm o seu Q de rotineiro, de aborrecido e de stressante...mas também tem muitos segredos que as pessoas que estão do lado de lá das linhas não percebem, não vêem e nem ouvem. Todos pensam que é fácil trabalhar num call-center. Mas não é. Aliás, os call-centers são as empresas mais subestimadas de sempre. Gosta-se de associar um call-center a um trabalho precário, para pessoas sem formação superior. De facto, num centro de assistência vê-se de tudo: desde os doutores, licenciados e mestres até aos adultos apenas com a quarta classe. E é um trabalho mal pago, isso também é verdade. Mal pago para os níveis de stress a que se chegam. Mas vivemos em crise. Uma crise que faz de nós as vítimas da excessiva terciarização. E mais vale ser telefonista do que ser desempregado.
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